Saturday, February 14, 2009

Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica

(edição de 1966)


Selecção, prefácio e notas de Natália Correia
Ilustrações de Cruzeiro Seixas

Edições Afrodite

A edição especial

A contrafacção

O processo em tribunal

A cinta

Na badana

Como um veio subterrâneo, mas de curso ininterrupto, desafiando interdições e talvez, deliberadamente infringindo espartilhas regras de bem pensar e bem sentir (ou de não dizer o que se pensa e sente), a Poesia Erótica desde os cancioneiros aos nossos dias tem acompanhado a evolução do lirismo pátrio. Trazê-la à superfície é, pois, um acto de necessária liberdade – ainda que a sua irrupção venha alterar o traçado das vias por onde, respeitoso daquelas regras, um certo lirismo ordeiramente caminha.

Luiz Francisco Rebello


«Finalmente!» «Até que enfim!» «Já não era sem tempo!» - Com exclamações como estas, e outras semelhantes, será decerto recebido o aparecimento da presente Antologia por todas aquelas pessoas de boa-fé, de boa vontade, de consciência límpida, que já existem neste País. Talvez não sejam muitas; mas vão-se tornando cada vez em maior número, na luta contra os preconceitos em que foram (mal) educadas, na guerra – surda ou aberta – ao tartufismo reinante, na corajosa assunção da plena dignidade dos seus sentidos.
Não ter medo das palavras é não recear as realidades que elas exprimem; é, sobretudo, evitar o trânsito pelo consultório do psiquiatra. Os maiores dos nossos poetas conheceram, desde sempre, esta forma de terapêutica. Difundi-la, eis o que importa, eis o que pode contribuir, de maneira decisiva, para encaminhar muita gente nessas ou noutras vias de redentora libertação.
Com é possível que uma Antologia como esta ainda não tivesse sido realizada? Mas devemos antes felicitarmo-nos pelo facto de só agora ser empreendida. Com efeito, ninguém melhor do que Natália Correia – com a profundidade e com a extensão de sua cultura, com a indiscutível garantia do seu génio poético, com as provas exemplares da sua coragem cívica – poderia superiormente desempenhar-se desta empresa.
Obra de erudição, de criação e de civismo, há-de constituir, para os vindouros, um documento indispensável, e o nome da sua Autora tornar-se-á credor da mais legítima gratidão; mas é provável que também suscite, em meia dúzia de paranóicos, em duas ou três dezenas de recalcadas, a sádica nostalgia das fogueiras do Santo Ofício. Pela nossa parte, não deveremos esquecer o caso daquele magistrado que judicialmente perseguiu, em França, a Madame Bovary, de Flaubert, e Les Fleurs du Mal, de Baudelaire: anos depois, já reformado, foi surpreendido, numa igreja, a introduzir estampas pornográficas nos livros de missa das devotas. São geralmente assim os defensores da moral pública.

David Mourão-Ferreira